O que houve em Chernobil?

Na madrugada do dia 26 de abril de 1986, à 1 hora, 23 minutos e 45 segundos, aconteceu o maior acidente nuclear da história. A Usina V. I. Lenin ficava a 20km da cidade de Chernobil, território da Ucrânia que na época fazia parte da União Soviética (URSS). Veja como aconteceu:

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O mundo era assim...

Mapa: Onde ficava a usina de Chernobil, na Ucrânia

O que era feito na usina?

A usina de Chernobil produzia energia elétrica por meio de fissão nuclear. Isso acontecia nos reatores nucleares; lá havia 4 deles no modelo RBMK, sigla russa para “Reator Canalizado de Alta Potência”. Veja a estrutura desse tipo de reator no desenho abaixo:

Infográfico: 4 reatores de Chernobil

O que é fissão nuclear?

É quando um átomo “racha” no meio, resultando em outros átomos e liberando energia na forma de calor. O principal elemento usado em Chernobil era o Urânio-235, naturalmente instável, pois seus átomos liberam nêutrons que se chocam com outros átomos de Urânio, produzindo fissão e gerando calor de maneira intensa.


Infográfico: Fissão nuclear

Calor para quê?

Para ferver água. Simples assim. A reação em cadeia fervia água ▸ cujo vapor resultante alimentava uma turbina ▸ que alimentava um gerador ▸ que produzia energia elétrica ▸ que abastecia 10% da União Soviética. Esse era o tamanho da importância da Usina de Chernobil.

Infográfico: Funcionamento de uma usina nuclear

E como se controla o reator?

A atividade é tão intensa dentro do reator que ele tem um sistema que freia a atividade nuclear, esfriando o reator caso as coisas saiam do controle: são as hastes de controle. Elas são feitas de boro, elemento que absorve os nêutrons e acaba com a brincadeira. Para explicar melhor, precisamos entender mais ou menos como era a estrutura do núcleo do reator:

Infográfico: Núcleo do reator RBMK

Hastes de combustível

São elas as responsáveis por produzir o calor resultante da reação nuclear.

Infográfico: Hastes de combustível do reator de Chernobil

Hastes de controle

Em maior número, as hastes de controle se abaixam (frear) ou se levantam (acelerar) conforme a necessidade de acelerar ou frear a reação nuclear.

Infográfico: Hastes de controle do reator de Chernobil

Enquanto isso, na sala de controle...

O trabalho de quem fica na sala de controle é exatamente esse: controlar a potência do reator, garantindo o equilíbrio entre as hastes. Foi aqui um dos focos do problema.

Quando as hastes de controle são abaixadas, elas se colocam entre as hastes de combustível, absorvendo os nêutrons e impedindo a fissão nuclear. Entenda melhor o movimento a seguir:

A “dança” dentro do reator

Infográfico: O que ocorre dentro do reator nuclear

E o que deu errado?

O desastre na usina de Chernobil aconteceu em decorrência de uma sequência de eventos durante um teste de segurança.

  • O teste era necessário para saber como resfriar o reator se alguma falha (ou algum inimigo 🇺🇸) cortasse a energia das bombas elétricas.
  • As bombas eram responsáveis por levar a água fria até o núcleo do reator.
  • Se houvesse falta de energia, o reator ficaria sem resfriamento e poderia explodir.
  • O mesmo teste já havia sido tentado nos 3 anos anteriores, sem sucesso.

O controle do estado interno do reator é feito pelos técnicos através de um medidor de megawatts, que mostra a potência. Quanto mais quente, maior o número mostrado. Esse medidor é fundamental para entender o que aconteceu:

Infográfico: Descontrole da potência do reator de Chernobil Infográfico: Descontrole da potência do reator de Chernobil Infográfico: O botão AZ-5 de Chernobil

A última grande falha

Pra condenar de vez toda a experiência, o projeto do reator tinha uma falha crucial: as hastes de controle que eram feitas de boro (para absorver os nêutrons e desacelerar as reações), tinham as pontas feitas de grafite, que era mesmo o elemento que envolvia as hastes combustíveis e permitia as fissões nucleares. Resultado: ao invés de frear, acelerou mais ainda.

Infográfico: Hastes de controle com pontas de grafite Infográfico: Descontrole da potência do reator de Chernobil

O que houve depois?

Todos demoraram muito para agir, por várias questões. Uma delas é que políticos tinham mais voz do que os cientistas, mesmo em uma situação como essa.

Pripyat (distrito industrial criado por causa da usina) foi lacrada logo nas primeiras horas, mas o governo soviético só começou a evacuação 36 horas depois do acidente.

Quantas mortes houve em Chernobil?

Segundo os relatórios oficiais, 31 pessoas morreram após a explosão. A ONU contabiliza 3.940 mortes indiretas por doenças causadas pela radiação. Mas o número exato é incerto. Alguns estudos apontam até 600 mil pessoas afetadas direta e indiretamente, incluindo mutações genéticas em crianças.

Consequências de Chernobil

  • Após o desastre, uma zona de exclusão inicial foi determinada com base em um raio de 30km a partir do local do reator.
  • Infográfico: Zona de exclusão de Chernobil
  • A União Soviética tentou ao máximo minimizar o incidente e só comunicou o ocorrido depois, quando cientistas da Suécia e Finlândia já haviam detectado a radiação no ar. Durante a guerra fria, qualquer sinal de derrota para os soviéticos representava vitória aos americanos.
  • O fogo demorou 16 dias para ser apagado, após helicópteros despejarem toneladas de areia, argila, boro e chumbo no núcleo do reator.
  • Essa mistura causou outro problema: uma espécie de lava radioativa que exigiu a drenagem da água das piscinas abaixo do reator, sob o risco de uma nova explosão.
  • Também foi necessária a construção de um sarcófago de concreto em volta do reator para minimizar os efeitos da radiação. Em julho de 2019, uma nova estrutura que custou mais de 1,5 bilhão de euros foi instalada no local: Sarcófago em volta da usina de Chernobil
  • Entre os primeiros a sofrer os efeitos da radiação estavam os bombeiros convocados para apagar um "incendiozinho" no teto da usina.
  • Ao todo, cerca de 600 mil pessoas, entre bombeiros, soldados e voluntários participaram de um esforço coletivo de limpeza da área. Eles foram apelidados de liquidadores e trabalharam diretamente expostos à radiação
  • Pripyat, que abrigava 50 mil pessoas na época, parou no tempo e virou uma cidade fantasma.
  • O engenheiro-chefe e o diretor da usina foram condenados a 10 anos de prisão

No fim das contas, o desastre de Chernobil também marcou o início do fim da União Soviética, que se dissolveu cinco anos depois, em 1991, conforme confessou o então líder de estado Mikhail Gorbachev.

Chernobyl, a série

Em 2019, a HBO lançou um seriado contando como foi o acidente nuclear de Chernobil. A minissérie se tornou a mais bem avaliada da história no IMDB, ultrapassando Breaking Bad e The Wire.

A série, criada por Craig Mazin e baseada no livro de Svetlana Alexijevich (Vozes de Tchernóbil, Cia. das Letras), também reacendeu o tema e o turismo na região, segundo a agência Reuters.

Onde assistir Chernobyl

A minissérie de 5 episódios está disponível online na plataforma de streaming HBO GO

Entenda o acidente de Chernobil no Gazeta Explica


Infográfico e ilustrações: Osvalter Urbinati. Pesquisa e roteiro: Fernando Rudnick e Jenifer Ribeiro.